A onda do politicamente correto; Ou: Somos realmente livres?

Publicado: 24 de fevereiro de 2015 por Kzuza em Comportamento
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O Controle de Armas é como tentar reduzir o número de bêbados dirigindo tornando mais difícil para as pessoas sóbrias dirigir seus próprios carros.

O Controle de Armas é como tentar reduzir o número de bêbados dirigindo tornando mais difícil para as pessoas sóbrias dirigir seus próprios carros.

Uma discussão recorrente que tenho tido ultimamente com familiares e amigos é a respeito da onda do politicamente correto, que vem avançando sobre nossa sociedade moderna nos últimos anos. A gangue dos cagadores de regras está à solta há muito tempo, suprimindo nosso direito à liberdade de expressão às custas de um tal neo-moralismo, ou sociedade mais justa e sem preconceitos.

Bem, mas será que todos param para pensar até onde o politicamente correto faz mal para nossa sociedade?

Ontem li a coluna de Denis Lerrer Rosenfield no O Globo, cujo título é Moralismo e Ilegalidade. Nele, o autor ressalta pontos muito importantes sobre o assunto, mas o principal deles, ao meu ver, é:

Ocorre uma renúncia à liberdade em função de um bem tido por maior, quando o maior perigo aí reside, a saber, tomar um valor qualquer como se fosse maior do que ao da liberdade.

E é justamente nesse ponto que eu quero tocar.

Há uma patrulha incessante por aí que se diz representante da opinião pública, julgando tudo o que acontece e apontando o dedo para dizer: Isso não pode! Isso é ofensivo!

Opa, mas pera aí, quem foi que disse que você tem o direito de não ser ofendido?

O Sr. Philip Pullman deu uma aula sobre isso. Ao ser questionado por um cara na plateia:

– Sr. Pullman, o título do seu livro (O Bom Homem Jesus e o Salafrário Cristo) parece a mim, como um cristão comum, algo ofensivo. Você chama o filho de deus de salafrário. Isso é uma coisa horrível de se dizer.

Deu como resposta:

– Sim, é uma coisa chocante de se dizer e eu sabia que era. Mas ninguém tem o direito de viver sem ser chocado. Ninguém tem o direito de viver a vida sem ser ofendido. Ninguém é obrigado a ler este livro. Ninguém é obrigado a pegá-lo, abri-lo… E se alguém abrir e ler, não será obrigado a gostar dele. Se você ler e não gostar, você não é obrigado a ficar calado. Você pode me escrever, reclamar e pode escrever à editora. Pode escrever aos jornais e até escrever o seu próprio livro. Você pode fazer todas essas coisas, mas o seus direitos terminam aí. Ninguém tem o direito de me impedir de escrever este livro. Ninguém tem o direito de impedir que ele seja publicado, vendido, comprado ou lido. E isso é tudo que tenho a dizer a respeito desse assunto.

Ainda voltando ao assunto passado sobre o atentado terrorista à redação da revista Charlie Hedbo em Paris (já comentado aqui, aqui e aqui), li também essa semana um excelente texto a respeito do assunto aqui. Nele, o autor ressalta:

Sugerir que ofender deve ser inaceitável é corrosivo e letal e não simplesmente para a liberdade de expressão, mas para a democracia. As pessoas têm o direito de dizer o que quiserem desde que não incitem a violência. Outros têm o direito de não querer ouvir ou assistir ou ler. Que usem o controle remoto e cancelem suas assinaturas de jornais. Ninguém tem o direito de ser ouvido. E ninguém tem o direito de não ser ofendido.

O que o papa Francisco está dizendo é que, embora a liberdade de expressão seja fundamental, deveria necessariamente, ser menos livre em uma sociedade plural. Na verdade, é precisamente porque nós vivemos em uma sociedade plural que precisamos ampliar e defender a liberdade de expressão. Em tal sociedade, é inevitável e importante que as pessoas ofendam a sensibilidade dos outros.

Inevitável porque onde diferentes crenças estão profundamente arraigadas, os confrontos não podem ser evitados. Quase por definição tais confrontos expressam o que é viver em uma sociedade diversificada. Sendo assim, eles devem ser resolvidos abertamente, sem hipocrisias, em vez de suprimidos em nome do “respeito” ou da “tolerância”.

Mais do que isso: a ofensa não é apenas inevitável, é essencial. Qualquer tipo de mudança ou progresso social significa ofender algumas sensibilidades. Aceitar que certas coisas não se pode dizer ou tentar silenciá-las, é aceitar que certas coisas não podem ser contestados. Nem melhoradas.

Acontece que, hoje em dia, uma pequena parcela da população é sensível demais a certos assuntos, sentindo-se ofendida ao mínimo sinal de contrariedade às suas opiniões. E é justamente essa parcela que tenta, muitas vezes com sucesso, impor o seu discurso de politicamente correto sobre os demais, colocando seus valores e opiniões acima de qualquer coisa. Quem quer que discorde do que a patrulha dos cagadores de regra diz, é imediatamente julgado como transgressor, fascista e moralmente inferior. Mas será que é isso mesmo?

Vamos ver só um outro exemplo. Agora no carnaval, algumas campanhas publicitárias foram vetadas (ou ameaças de veto) porque, segundo o movimento feminista, vulgarizavam e promoviam à violência à mulher (veja o que a esquerda diz sobre o assunto aqui). A tal campanha da Skol, que gerou mais polêmica por cartazes como “Esqueci o NÃO em casa”, foi suspensa pela própria Ambev porque um grupo de 30 (isso mesmo: trinta!) mulheres reclamaram por se sentirem ofendidas. Pense bem: de todo o público atingido pela campanha, apenas 30 mulheres se manifestaram contra a mesma, dizendo-se representantes de todas as mulheres. Será que é mesmo? Pergunte às mulheres que você conhece e veja quantas delas se sentem ofendidas com esse tipo de coisa. Aposto que a maioria das mulheres que você conhece se sentem bem mais ofendidas com mulheres que expõem seus corpos nus durante os desfiles na avenida.

Agora veja só que hipocrisia. Na mesma época, a Sadia lançou uma nova campanha sobre o seu presunto. Veja o vídeo abaixo:

Agora imagine se o fatiador fosse, ao invés de um homem, uma mulher. Você tem dúvida de que a patrulha dos cagadores de regra não estaria em cima?

O mesmo princípio se aplica a outros assuntos polêmicos, como o homossexualismo, por exemplo. Qualquer coisa que seja dita contra a liberdade sexual dos indivíduos é automaticamente taxada como homofobia. Outro dia escutei de um amigo:

Se você é contra o casamento gay, você é automaticamente homofóbico.

A dificuldade em se criminalizar a homofobia é justamente conseguir tipificar o crime. Hoje em dia, o simples fato de ser contra ou de se não gostar de determinada coisa é imediatamente classificada como “alguma-coisa-fobia” ou “incitação ao ódio”. Mesmo quando seus argumentos se baseiem em estudo científicos ou em seus valores morais ou religiosos. Mesmo que você não agrida ninguém.

Ainda sobre homossexualismo, é tabu na sociedade moderna e politicamente correta levantar alguns pontos polêmicos, como os que podemos ler aqui, aqui e aqui. Mesmo que a maioria dos povos ao redor do mundo recusem a agenda gayzista por razões morais, os cagadores de regra afirmam que você deve aceitar isso como normal, ainda que:

A falácia dos 10 por cento: Estudos indicam que, ao contrário das afirmações inexatas (mas amplamente aceitas) do pesquisador sexual Alfred Kinsey, os homossexuais constituem entre 1 e 3 por cento da população.

Os homossexuais estão sobre-representados nas infrações sexuais infantis: Indivíduos de entre 1 e 3 por cento da população que tem atração sexual pelo mesmo sexo cometem até um terço dos crimes sexuais contra crianças.


Conclusão: Na minha modesta opinião, há uma onda coordenada tentando restringir a liberdade de opinião das pessoas e acabar com valores morais que norteiam a sociedade, classificando isso como um obstáculo para a humanidade ter atingido o ápice de seu desenvolvimento. Utilizam-se de desculpas como o estabelecimento de uma sociedade mais justa e livre de preconceitos para impor opiniões de uma minoria sobre toda a população, como se fossem representantes terrenos de uma divindade maior. Justificam suas atitudes e opiniões como necessárias para uma nova sociedade melhor, sem conseguir de fato medir o quanto isso será, de verdade, possível no futuro.

Ainda creio que estamos tentando remediar os sintomas sem de fato conhecermos a doença. Clamamos por cada vez mais antitérmicos sem descobrir qual a causa da febre. Queremos reduzir a violência praticada por menores de idade reduzindo a maioridade penal. Queremos reduzir o número de mulheres que morrem em clínicas clandestinas liberando o aborto. Queremos mais negros nas universidades criando sistemas de cotas. Queremos menos pobres distribuindo dinheiro dos ricos para eles. Mas o fato é que ninguém se preocupa em realmente acabar (ou ao menos diminuir) com a causa raiz do problema.

comentários
  1. […] é, digamos, aceitável. Cada um sente-se ofendido com coisas diferentes (já escrevi sobre isso aqui). Ninguém diz que você não pode ser ofendido. Da mesma forma, acredito ser perfeitamente […]

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